sexta-feira, 2 de setembro de 2016

AULA 1: LINGUAGENS, LÍNGUA, SIGNO LINGUÍSTICO, SEMIOLOGIA, LINGUÍSTICA, COMUNICAÇÃO, GRAMÁTICA E DISCURSO

       Professor: Márcio Alessandro de Oliveira.
       Objetivo: Fixar os conceitos que compõem o título desta aula.

Fixem-se os conceitos e as explicações abaixo:

1. Linguagem: 1.  Capacidade de estabelecer comunicação.  2.  Conjunto de sinais usados para estabelecê-la que podem ser linguísticos (verbais) ou não.  (Toda coisa que represente outra é um sinal.  Um charco, também conhecido como poça de água, é sinal de chuva passada ou presente; da mesma forma, o vento pode ser sinal de que vai chover.)
1.1. Linguagens não verbais: São aquelas formadas pelos seguintes signos, sinais que representam ou indicam coisas (e é importante saber que NÃO se trata de signos zodiacais):
índices;
ícones;
(Segundo o Minidionário Escolar da Língua Portuguesa, de Dermival Ribeiro Rios, ícone é a imagem da Virgem, de Cristo ou dos santos na igreja ortodoxa.  E existe a iconografia, que estuda e descreve medalhas, imagens, pinturas, etc.)
símbolos NÃO VERBAIS (não linguísticos).
O balanço da cauda de um cachorro é um índice; o desenho de uma casa pode ser um ícone; e os símbolos exigem interpretação ou fixação do seu significado por meio da tradição.  A cruz, antes de Cristo, era um símbolo com um significado bem diferente.  Uma criança que não seja educada ou instruída não pode ligar o símbolo da cruz a seu significado atual.  O índice e o ícone dispensam a educação: podem ser entendidos sem que uma geração mais antiga revele à outra, mais nova, o que eles representam.
Os símbolos são a matéria-prima de qualquer discurso.  Todo discurso é uma mensagem, mas nem toda mensagem é um discurso.  Este só pode ser produzido por seres históricos, isto é: por seres que têm a certeza da mortalidade, possível graças ao senso de narrativa dos seres humanos, que sabem que a história de toda pessoa tem início, meio e fim.  Desse modo, um cachorro faminto pode ser "eloquente" quando pede comida latindo (os latidos são índices; cães usam apenas índices para indicar ou externar o que sentem: símbolos, linguísticos ou não, são usados apenas por humanos, a despeito de os cachorros supostamente sonharem, e sonhos contêm símbolos, de acordo com a teoria de Freud), mas, apesar de seu eventual instinto de sobrevivência diante, por exemplo, de um carro em alta velocidade, do qual pode tentar escapar ou se proteger, não se vê como um ser que sabe que vai morrer de morte natural; da mesma forma, não se vê como um ser que sabe, nem como um ser que sabe que sabe, pois, de fato, não tem faculdade para nada disso.  Só os humanos produzem discursos em forma de pinturas, músicas, esculturas, poemas, etc.  Os cães, estes podem apenas produzir mensagens.
1.2. Língua (ou linguagem verbal): Conjunto de signos linguísticos (palavras) que sofre as variações histórica, geográfica, social e de idade.  Trata-se de um conjunto de símbolos VERBAIS (linguísticos).
Os signos linguísticos podem carregar sentido figurado (coisa que não existe na linguagem animal).  Contam com um conjunto de regras de formação, significação, seleção e combinação de palavras (gramática).  Pode a língua ser artificial (criada em laboratório, como o esperanto).  Também pode contar com duas modalidades: a falada e a escrita.  (Nem todas as comunidades humanas inventaram a escrita, que pode ser fonográfica, como a nossa, ou ideográfica, como a dos chineses.)
As línguas de sinais são línguas mesmo, e não meras linguagens, pois sofrem as variações histórica, social e de idade.  Também contêm gírias e sentido figurado, e são instituições, assim como a Língua Portuguesa e as demais línguas baseadas no som.  A diferença entre estas e as de sinais é que toda língua de sinais usa signos visuais, e não auditivos.  Detalhe: cada país tem sua própria língua de sinais.
É importante frisar que toda língua varia.  A variação geográfica é provada com os dialetos, variedades regionais de um idioma marcadas por traços da pronúncia, do vocabulário e da sintaxe.  Os romances eram dialetos do latim vulgar, e deram origem às línguas neolatinas, também conhecidas como línguas românicas.

A ARBITRARIEDADE DO SIGNO LINGUÍSTICO

Toda palavra é um signo linguístico formado por uma sequência de sons, e todo signo é uma coisa que está no lugar de outra, de modo que a primeira possa representar a segunda.  Assim, elefante está aqui no lugar daquele animal. A sequência de sons é como uma fotografia. Por isso diz-se que ela (a sequência) é (que nem) uma imagem acústica.  É claro que não se trata de uma imagem de verdade, assim como o orelhão, o telefone público, não é uma orelha de verdade.  Mas são parecidos.  Como a função do conjunto de fonemas é idêntica a de uma foto...
Essa sequência também é conhecida como significante, e está ligada ao significado, que, por sua vez, é um conceito, uma coisa abstrata que temos na mente por causa de algo concreto.  (Significante é o que produz significado.)  O elefante não pode ficar na mente. O que nela fica é o conceito elefante. E a sequência de fonemas elefante (/e/ /l/ /e/ /f/ /ã/ /t/ /i/) não se liga ao animal: liga-se ao conceito, ao significado.  Este, por sua vez, está ligado ao ser físico, concreto. (Palavras há que designam coisas puramente abstratas. É esse o caso de felicidade, de ódio, de bondade e de outros vocábulos que denominam coisas não físicas, isto é: coisas que não são externas ao corpo e que não se podem experimentar com pelo menos um dos cinco sentidos.  Elas são reais, mas não são físicas.  Obviamente não podem existir por si sós: não há, por exemplo, felicidade sozinha: o que há são pessoas felizes.)
É arbitrária a ligação entre significante e significado, conforme o postulado de Ferdinand de Saussure, linguista genebrino que formulou a teoria aqui reproduzida.  Assim, cada língua usa um significante diferente para um mesmo ser ou objeto: o que os povos de língua inglesa chamam de water nós chamamos de água.
O significante é de dupla natureza: há a natureza psíquica e a natureza física.  Vejamos: Eu olho para uma lagartixa pela primeira vez na vida, abstraio (isto é, extraio) a imagem dela e gravo-a na memória:
        
       lagartixa (ser físico) → conceito memorizado (significado) → substantivo lagartixa (significante também memorizado que pode ser pronunciado ou escrito)

Se em vez de pronunciar “lagartixa” eu falo “laRgatixa”, o significante não ficou “nítido” na memória.  (Essa é a natureza psíquica do signo.)  Agora: se digo “lagartixa”, o significante ficou bem gravado na memória, e é perfeita a materialização, isto é: a produção de fones (que obviamente se dá na minha boca).  (Essa é a natureza física do signo.)  Sem a materialização, não existe conversa, porque sem ela não ocorre produção de significado na mente do ouvinte.
Obviamente a materialização do signo também se dá quando escrevemos, mas é preciso entender que nem todas as línguas contam com a modalidade escrita.  E das que se escrevem nem todas usam silabários, como o japonês, ou grafemas ou fonogramas (letras que representam sons) como os do alfabeto romano: algumas usam ideogramas, como o chinês.
O significante é a parte acústica do signo; este, quando escrito, também se torna algo físico, mas só para a visão: a sua parte sonora é realmente física apenas quando a palavra é enunciada de viva voz, pois só desse modo a audição é usada.
Por fim: É óbvio que a materialização sonora do signo é muito diferente da materialização visual, porque falar é muito diferente de escrever.  A língua escrita e a língua falada são formas completamente diferentes de manifestação do pensamento.  Isso se comprova não só nas dificuldades ortográficas (veja-se, por exemplo, o caso da letra X e os sons por ela representados em português), mas também nas situações comunicativas, no suporte físico do discurso escrito (como o papel ou o teclado do computador), no processo de elaboração de um escrito, que não recebe o auxílio das inflexões de voz, e em muitos outros fatores que geram enormes diferenças.

SEMIOLOGIA E LINGUÍSTICA

        A Semiologia, também conhecida como Semiótica, estuda todos os signos e, portanto, todas as linguagens, assim como estuda também todas as mensagens, todos os discursos e seus significados.  A Linguística, por sua vez, estuda apenas os signos linguísticos e todas as línguas conhecidas.  Assim, se um motorista começa a buzinar para outro, o linguista não verá na mensagem dele um objeto de estudo, mas o semiólogo sim.  Os sons da buzina são uma linguagem, mas não são uma língua.  Se, no entanto, o motorista gritar: “Sai da frente!”, o linguista e o semiólogo terão um objeto de estudo em comum.
Há quem faça distinção entre Semiologia e Semiótica.  Esta pode ser dividida em mais de uma corrente, como a semiótica discursiva.  Mas, independentemente das correntes da Semiótica e das diferenças entre ela e a Linguística, ambas as ciências tem algo em comum: a comunicação.
(Umberto Eco era semiólogo.  Saussure, Jakobson, Bakhtin e Chomsky são grandes nomes da Linguística.)
Observações:
1ª: Estudar uma língua não é estudar Linguística, assim como estudar Linguística não é estudar língua, embora o professor de língua, que NÃO é necessariamente um linguista, enuncie e aplique os conhecimentos da Linguística em aula.  O linguista produz conhecimentos científicos, ao passo que o professor de língua enuncia esses tais.  O trabalho de um é científico, o do outro, pedagógico.  O professor não tem a obrigação de produzir conhecimento científico, mas tem o dever de estar em dia com ele por meio da leitura de textos de divulgação científica, escritos por autores que já provaram que não há nem o certo nem o errado na língua.
2ª: Tanto a Semiologia como a Linguística partem do princípio de que, ao transmitirmos ideias ou sentimentos por meio de uma linguagem ou de duas ou mais, provamos que somos capazes de transformar um objeto em informação.  Isso quer dizer que primeiro vem o mundo, e depois a linguagem que o representa ou o enuncia.  Contudo, poderia a linguagem dar origem ao mundo?  Segundo a Bíblia, sim, e há quem diga que a matemática seria a linguagem com que foi criado o universo.  No caso da ficção, em que o ficcionista é quase um deus, não é bem isso o que acontece, já que quem produz ficção se baseia no real, coisa que não se faz quando não existe nada, como na história bíblica.  Mas isso não é o mais importante.  Importante mesmo é saber que a língua não é só um instrumento de comunicação: é também um instrumento de manipulação e controle das massas.

COMUNICAÇÃO

       1. Conceito de comunicação: É o ato de tornar comuns os sentimentos e as ideias através de uma mensagem.

   2. ELEMENTOS DA COMUNICAÇÃO E FUNÇÕES DA LINGUAGEM (TEORIA DA COMUNICAÇÃO, DE JAKOBSON)

       Assunto (ou referente):É o tema da mensagem.  (Liga-se à função referencial, denotativa.)

       Emissor: É quem fala, escreve, toca música, dança, etc.  (Liga-se à função emotiva.)

       Receptor: É quem escuta, lê ou usa qualquer sentido para decifrar uma mensagem.  (Liga-se à função conativa, apelativa.)

       Mensagem: Filmes, peças teatrais, cartas, músicas, romances, tudo isso são mensagens.  (Liga-se à função poética.)

       Canal: É o suporte físico da mensagem.  Pode ser uma folha de papel, mas também pode ser o muro de uma cidade.  (Liga-se à função fática.)

       Código (ou linguagem): É o conjunto de sinais (signos) usados para produzir sentido (ou para não produzir sentido nenhum.  (Liga-se à função metalinguística.)

       Função referencial: É a função que se destaca quando o objetivo principal da mensagem é informar.

       Função emotiva: Está presente em discursos em que o emissor revela o seu mundo interior, como acontece em poemas líricos e em exclamações que escapam da boca de pessoas que levam um grande susto por uma ação assustadora ou inesperada, como em certas peças de programas televisivos.

       Função conativa, ou apelativa: É a função predominante quando a intenção principal é a de convencer o receptor ou mudar o seu comportamento.  É graças a essa função que a classe média de Teresópolis odeia tanto Lula e Dilma.  Tal função se destaca em anúncios publicitários de revistas, comerciais de televisão, comandos e textos argumentativos.

       Função poética: Concentra-se na mensagem e na sua estética.

       Função fática: Nota-se quando é valorizado ou iniciado o contato pelo uso do vocativo, como quando alguém diz: "Oi, Fulano!" ("Fulano" é o vocativo: representa a pessoa a quem se dirige a palavra).  Nota-se também no momento em que se testa o canal de comunicação, como quando atendemos o telefone e dizemos: "Alô?".

       Função metalinguística: Aparece em mensagens cujo tema seja a língua ou a linguagem.

       Pode-se estabelecer o esquema seguinte:

Elementos da comunicação e funções da linguagem (Teoria da comunicação)




Assunto (referente)
Função referencial (Função denotativa)
Emissor                                                                                                   Receptor
       Função emotiva                                             Mensagem                 Função conativa (apelativa)
Função poética
Canal
Função Fática
Código
Função metalinguística

GRAMÁTICA ADQUIRIDA E GRAMÁTICA NORMATIVA

       A gramática é um conjunto de regras de formação, seleção, combinação e significação de palavras.  Todos nós temos uma gramática, que adquirimos SEM o esforço intelectual da aprendizagem formal, ou seja: que adquirimos inconscientemente, já que, na infância, não percebemos que estamos aprendendo a falar.  A nossa gramática adquirida é vigiada pela gramática normativa, ensinada na escola.  Pode-se dizer que ela se subdivide em alguns ramos, a saber:

       Fonética: Estuda o aparelho fonador e a produção de fones (sons usados pelos falantes) em sua natureza MATERIAL; assim, constata a diferença entre a pronúncia de um cearense e a de um carioca, que proferem a palavra "tia" de formas diferentes: o som de "t" produzido pelo nordestino é o alofone (variação de um fone) do "t" do carioca.  Ambos os fones desempenham a mesma função, e por isso correspondem ao mesmo fonema, que é o valor funcional (e não material) do fone.

       Fonologia: Preocupa-se com o valor FUNCIONAL dos fonemas.  Para ela, não importa que o cearense e o carioca pronunciem "tia" de formas diferentes, pois não foi comprometido o bom uso do vocábulo.  O que interessa à Fonologia é o funcionamento do fonema e o seu valor distintivo, já que ele é a menor unidade sonora dentro da palavra; por isso "Bala", "Vala" e "Ala" são palavras diferentes.  A substituição de um fonema, assim como a eliminação de um, causa diferença.  Isso não interessa à Fonética.  É como se a Fonética se preocupasse apenas com a estrutura da cadeia (sequência) de fones, e a Fonologia, com o funcionamento deles, assim como a anatomia estuda o corpo e a fisiologia, o funcionamento.

       Prosódia: É a identificação da sílaba tônica.  As palavras abaixo têm entonações diferentes (o acento prosódico, que nem sempre equivale ao acento gráfico, muda de lugar):

sábia                                 sabia                             sabiá

       Ortoepia (ou ortoépia): É a correta pronúncia das palavras.  A ortoepia pressupõe a boa prosódia, embora a prosódia de uma palavra possa ficar inalterada mesmo quando se comete erro de pronúncia.  "Flamengo" e "Framengo" são nomes paroxítonos (a sílaba mais forte é sempre a penúltima), mas "Framengo" é considerado barbarismo (um erro mesmo).

       Ortografia: É a escrita correta das palavras.  São muito arbitrárias as regras ortográficas vigentes.  Além disso, a grafia correta de um termo nem sempre está de acordo com a ortoepia.  "SuBLinhar", por exemplo, deve ser proferido SEM encontro consonantal, desta forma: "Subilinhar".  Ninguém está totalmente imune a erros.  Quem se guia apenas pelo som corre o risco de cometer cacografias; da mesma forma, quem leva em conta apenas a ortografia acaba eliminando "erros" que nem existem.  Um exemplo é a pessoa que lê "dEsgraçado" em voz alta fazendo questão do /ê/, que é fechado, quando "disgraçado" também é forma correta de pronunciar (a letra "e" representa pelo menos três sons: o de /ê/, vogal fechada, o de /é/, vogal aberta, e o de /i/ fraco).  A grafia correta é sempre a mesma, mas a pronúncia não.  Por fim: é a ortografia que estuda as regras de acentuação gráfica e as formas variantes acolhidas pela norma culta padrão, tais como: "fLauta" e "fRauta", "registar" e "registRar" e outras.                           

       Semântica: Estuda a significação das palavras.  Nessa parte se encontram sinônimos, antônimos, homônimos e parônimos.  Creio que a semântica não seja muito diferente da hermenêutica, que analisa o significado das palavras dentro do texto.  Deduz-se que a semântica muito interessa aos dicionaristas, também conhecidos como lexicógrafos.  Vê-se que ela se relaciona com a morfologia, posto que a classe gramatical de uma palavra pode determinar o seu significado.

       Morfologia: É a parte da gramática que estuda os morfemas, unidades portadoras de significado.  São eles: o radical, a vogal temática, o prefixo, o sufixo, as desinências, as vogais de ligação e as consoantes de ligação.  (Recorre à etimologia, a origem de uma palavra.  Exemplo: o verbo "comer" tem como radical o morfema "com-", mas a sua raiz, que é um radical mais antigo, vem do verbo latino "edere".)  Ela também se ocupa dos processos de formação de palavra.  Outro estudo importante que faz é o das classes de palavras, ou classes gramaticais, que são dez.  Algumas são variáveis, ou seja: sofrem a flexão de gênero, a de número e a de grau (por isso o português é uma língua flexiva); outras são invariáveis, como as conjunções.  Uma coisa interessante que nos ensina é a constatação de palavras cognatas (que têm o mesmo radical).  Exemplos: COMUNICar, COMUNICação, COMUNICabilidade, COMUNICado, COMUm.

       Sintaxe: É o ramo da gramática que cuida da combinação e do funcionamento das palavras.  Divide-se nos seguintes ramos:

       análise sintática, que identifica as orações, os períodos e os analisa e estuda os seus termos;

       sintaxe de regência, relativa à dependência entre os termos preposicionados ou não que vêm depois de um nome ou de um verbo;

       sintaxe de concordância;

       sintaxe de ordem, dentro da qual se estudam as regras de colocação pronominal;

       e sintaxe de pontuação.

       Morfossintaxe: É a análise morfológica unida à análise sintática.  Uma depende da outra.  Um exemplo: Na frase

       Márcio se opõe aos valores da classe média

       o nome próprio é, obviamente, um substantivo, e uma das funções do substantivo é a de sujeito, um termo essencial da oração.  A relação classe gramatical-função sintática (ou função sintática-classe gramatical) é morfossintática.  Outra prova dessa relação é o fato de a oração só existir quando há verbo na frase.  Ora, o que determina a classificação de uma palavra como verbo é a morfologia.


DISCURSO

Ficou dito que apenas seres humanos podem produzir discursos, que são feitos de várias formas.  Filmes, pinturas, músicas, peças teatrais, textos literários (e não literários também), tudo isso são discursos.  Todo objeto simbólico é um discurso, porque esse tipo de objeto produz um efeito nas pessoas que o decifram com os sentidos e com o raciocínio.
Só para frisar o óbvio, com a inevitável repetição: animais (refiro-me ao animais irracionais) não usam símbolos: usam apenas índices; portanto, não produzem discursos.
O discurso é um efeito da interação, e pode ser estudado de várias formas, a depender da perspectiva teórica adotada.
Há os discursos sincréticos, que usam tanto a linguagem verbal (língua) como outras linguagens.  Exemplos: histórias em quadrinhos, filmes, canções.
Os discursos que usam apenas palavras (linguagem verbal) podem ser estudados pela Linguística Textual.  Para ela, o texto é como uma superfície com início, meio e fim.
A semiótica discursiva leva em conta os percursos gerativos de sentido, que são três.
Os Estudos de Semântica sabem que o significado das palavras pode ser estático, mas entende que o sentido não se confunde com o significado: este é estável, mas aquele é variável por ser determinado pelo contexto.  Assim, a pergunta "Como se sente?" feita por um médico tem um sentido diferente do que teria se fosse feita em outra situação pelo profissional de outra área do conhecimento humano, ainda que o significado sempre seja basicamente o mesmo.
A perspectiva que mais interessa em tempos de disputa pelo poder é a Análise do Discurso de linha francesa.  Para ela, o discurso é um efeito, e o sentido também.  Na verdade, o discurso é um efeito de sentido.  Assim, se pela manhã eu digo que fiz o desjejum em vez de dizer que já tomei café, causarei o seguinte efeito: pedantismo.  (A língua é variável, e onde há variação, há avaliação.  Todos são julgados pelas escolhas que fazem.  A frase tem pleo menos duas variantes, e em uma delas há o substantivo "desjejum".)
A AD parte do pressuposto de que o não dito comparece no dito, porque só parte do dizer é dizível.  Assim, um dos editoriais de O Globo não diz que quer os pobres fora da universidade pública, nem diz que é a favor de que capitalistas (empresários) lucrem com o ensino superior privado, mas sabemos que é isso o que o jornal quer, porque os sentidos são históricos, e não de quem fala ou escreve.  Sendo históricos, são condicionados pelo inconsciente e pela ideologia (todos têm ideologia).
Levando em conta a história, o inconsciente e a ideologia (à qual as pessoas ficam submissas), a AD não extrai apenas os sentidos do discurso: ela descobre também como e por que se constroem.
A AD sabe que o sentido de um texto ou discurso não é único: ele sempre pode ser outro, embora não possa ser qualquer um.  Assim, se eu resumir a história do romance Drácula de viva voz, o ouvinte não vai se lembrar de tudo depois que eu terminar o resumo (e por isso vai haver um desvio de sentido), mas ele nunca vai entender que Drácula é uma fada.

***

Como foram estabelecidos os conceitos aqui explicados, podemos estudar as diferenças entre a fala e a escrita na próxima aula.

            Referências bibliográficas:
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires.  Filosofando: Introdução à Filosofia.  São Paulo: Moderna, 1986.
FARACO, Carlo Emílio; MOURA, Francisco Marto.  Literatura Brasileira.  17ª edição.  São Paulo: Editora Ática, 2003.
MONNERAT, Rosane; VIEGAS, Ilana Rebello.  Português I (vol. 1).  Rio de Janeiro: Fundação Cecierj, 2012.
MEDEIROS, Vanise; SOUSA, Silvia Maria de.  Linguística I (vol. 1).  Rio de Janeiro: Fundação Cecierj, 2012.  
ORLANDI, Eni Pulcinelli.  O que é Linguística.  São Paulo: Editora Brasiliense, 7ª edição, 1994.

SAUSSURE, Ferdinand.  Curso de Linguística Geral.  (Tradução de Antônio Chelini, José Paulo Paes e Izidoro Blikstein.)  São Paulo: Cultrix, 20ª edição, 1995.



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